domingo, 25 de outubro de 2015

JOHN WAYNE É UM 'TIGRE' SOBREVOANDO OS CÉUS DA CHINA

Antes de a Segunda Guerra Mundial começar oficialmente para os Estados Unidos, alguns de seus cidadãos já estavam envolvidos nos combates, ao lado dos aliados, na Europa e Ásia. Pilotos do Tio Sam uniram forças à britânica RAF (Royal Air Force) contra os intermináveis bombardeios alemães à Inglaterra. Ganhou fama, na China, o grupo de aviadores formados por voluntários e mercenários que contribuiu para a proteção do país contra as investidas japonesas. Batizado como Flying Tigers (Tigres Voadores), guarneciam principalmente as rotas comerciais com a Birmânia. A presente realização de David Miller, lançada em 1942, é envelhecida e deslavada peça de propaganda a exaltar as missões da esquadrilha. Trata-se de produção pobre, condizente com a capacidade de encenação da diminuta Republic Pictures. John Wayne, em atuação displicente, faz o Capitão Jim Gordon, diligente comandante de um grupo de pilotos ao qual se junta o bonachão e irresponsável aviador Woody Jason (John Carroll). A fordiana Anna Lee interpreta a abnegada enfermeira Brooke Elliott. Os chineses sorriem agradecidos. Quanto aos "traiçoeiros" japoneses... Que se cuidem. A apreciação a seguir é de 1975.





Os Tigres Voadores
Flying Tigers

Direção:
David Miller
Produção: 
Republic Pictures
EUA
1942
Elenco:
John Wayne, Anna Lee, John Carroll, Paul Kelly, Mae Clarke, Gordon Jones, Tom Neal, Addison Richards, Edmund MacDonald, Bill Shirley, Malcolm "Budd" McTaggart, David Bruce, Chester Gam, James Dodd, Gregg Barton, John James, os não creditados Richard Crane, Elvira Curci, Rico De Montez, Eddie Dew, Dan Dowling, Walter Fenner, Willie Fung, Bill Hunter, Anne Jeffreys, Allen Jung, Dorothy Kelly, Charles La Torre, Charles Lane, Lotus Long, Richard Loo, Dick Morris, Nestor Paiva, José Pérez, Tom Seidel, Bhogwan Singh, Eleanor Soohoo, Dave Willock, Victor Wong e em cenas de arquivo Franklin Delano Roosevelt.


Claire Chennault, capitão aposentado da força aérea do Exército dos Estados Unidos e idealizador dos Flying Tigers, o primeiro Grupo Voluntário Americano (AVG), formado por pilotos da Aeronáutica e dos Fuzileiros Navais. Foi criado por sanção secreta do presidente Franklin Delano Roosevelt e sua função primordial consistia em proteger do invasor japonês as rotas comerciais da China com a Birmânia 



Os Tigres Voadores é contribuição ao esforço de guerra realizada no calor da hora, principalmente para os estadunidenses — mal refeitos do fulminante ataque desferido pelos japoneses à base havaiana de Pearl Harbor.


Antes de os Estados Unidos entrarem para valer na Segunda Guerra Mundial, alguns de seus cidadãos já lutavam contra o Império do Sol no espaço aéreo da China. Não compunham as forças regulares. Formavam um grupo de voluntários e mercenários intitulado Flying Tigers (Tigres Voadores). Logo no começo o filme estampa o agradecimento que lhes dirigiu o Generalíssimo Chiang Kai-Shek (Chefe de Estado chinês na ocasião), enaltecendo-lhes a ação, coragem, espírito de luta e apoio dado à força aérea do país na defesa do povo e território acossados pelo Japão. Os "Tigres" tinham por objetivo principal a proteção de estratégica rota comercial entre China e Birmânia. Cada piloto recebia o equivalente a 600 dólares mensais mais o significativo acréscimo de 500 dólares por avião abatido.




Acima e abaixo: John Wayne como  o Capitão Jim Gordon


No filme, o grupo é comandado pelo Capitão Jim Gordon — interpretado por um John Wayne impassível, em atuação tão displicente quanto burocrática. É piloto experiente e oficial aplicado, sempre preocupado com a integridade dos comandados e o bom estado dos equipamentos. No tempo livre corteja Brooke Elliott (Lee) — enfermeira do campo. Ela, além de cuidar da saúde dos aviadores, auxilia um hospital de crianças vitimadas por bombardeios.



Acima e abaixo: Jim Gordon (John Wayne) e a enfermeira Brooke Elliott (Anna Lee).


O cotidiano da companhia fica mais agitado com a chegada do piloto Woody Jason (Carroll), antigo companheiro de Jim. É um tipo alegre, galanteador, sentimental, bom de briga, mas excessivamente individualista e irresponsável. Falta-lhe o necessário espírito de equipe. Logo provoca a destruição de um avião, inutilmente, e a morte de um colega. Mais tarde, mesmo ciente de possível missão, abandona a prontidão para jantar com Brooke. Em decorrência, outro piloto morre após decolar no lugar de Jason, mesmo estando fisicamente impossibilitado de voar. Diante disso, o novato é desligado da esquadrilha e confinado ao alojamento até conseguir transporte para fora do campo.


 Jim Gordon (John Wayne) ladeado pelos pilotos dos Flying Tigers


Enquanto isso, Jim se oferece como voluntário em missão suicida: explodir ponte e comboio japonês. Decolará carregado de nitroglicerina. É a chance aguardada por Jason para se redimir com o amigo e comandante. Levanta voo quando Jim embarca, surpreendendo-o e mantendo-se no controle do aparelho. Nas proximidades do objetivo são atacados pela bateria antiaérea japonesa. O avião entra em chamas e Jason oculta um grave ferimento. Sugere o abandono da aeronave. Jim, o primeiro a saltar, é praticamente empurrado para fora pelo apressado amigo. Entretanto, não é seguido. O personagem de Carroll, em atitude heroica, reassume os controles. No salto Jim percebe manchas de sangue no blusão e antecipa o que está por vir. Ainda no paraquedas, vê a destruição da ponte pela nitroglicerina; depois, o comboio japonês apanhado em cheio pelo choque do avião.


Jim Gordon (John Wayne) e Woody Jason (John Carroll).


Os Tigres Voadores é propaganda belicosa e deslavada. O diretor David Miller manipula roteiro convencional de Kenneth Gamet e Barry Trivers da forma a mais desinibida possível. Procura passar ao espectador um retrato simpático e generoso dos combatentes estadunidenses: os chineses respiram e sorriem aliviados sempre que a esquadrilha volta ao ponto de partida; Brooke oferece toda atenção às crianças feridas, algumas mutiladas pelo fogo inimigo. Até Jason comparece ao hospital para distraí-las com truques mágicos. O personagem de John Wayne, em momento de descontração, chama de "pernilongos" os tiros que perfuraram a fuselagem de seu aparelho.


À esquerda, John Wayne no papel do Capitão Jim Gordon


Já os japoneses recebem o tratamento esperado. São os traiçoeiros. Praticamente não são vistos. Poucas vezes têm o rosto mostrado. Costumam ser substituídos pelas sombras móveis e assustadoras que seus aviões projetam no solo. Sobram-lhes designações em tudo pejorativas: “ratos”, “homenzinhos”, “malditos japs” etc.


Jim Gordon (John Wayne) fornece instruções aos pilotos dos Flying Tigers


A produção não consegue esconder a pobreza característica dos filmes da Republic. Mas há uma razoável junção de cenas autênticas  provenientes de arquivos militares  para a encenação dos combates aéreos, convincentes para a época.





Roteiro: Kenneth Gamet, Barry Trivers, com base em história de Kenneth Gamet. Direção de fotografia (preto e branco): Jack A. Marta. Montagem: Ernest J. Nims. Direção de arte: Russell Kimball. Decoração: Otto Siegel. Trilha musical: Victor Young. Direção musical: Walter Scharf. Guarda-roupa: Adele Palmer. Efeitos especiais: Howard Lydecker, Theodore Lydecker (não creditado). Produção associada: Edmund Grainger. Penteados: Peggy Gray (não creditado). Maquiagem: Bob Mark (não creditado). Gerente de unidade de produção: Arthur Siteman (não creditado). Gerente de produção: Al Wilson (não creditado). Assistente de direção: Philip Ford (não creditado). Direção da segunda unidade: George Sherman (não creditado). Som: Daniel J. Bloomberg (não creditado). Edição de som: T.A. Carman (não creditado). Coordenação de dublês: Yakima Canutt (não creditado). Dublê: Paul Mantz (não creditado). Operador de câmera em locações: William Bradford (não creditado). Assistentes de câmera (não creditados): Nels Mathias, Cliff Shirpser. Orquestração (não creditada): Herman Hand, George Parrish, Leo Shuken. Gerente de locações: John T. Bourke (não creditado). Marcação para John Wayne: Sid Davis (não creditado). Consultores técnicos (não creditados): Lawrence Moore, Kenneth Sanger. Agradecimentos a: William D. Pawley, fundador do The American Volunteer Group, pela cooperação e assistência técnica prestadas à produção. Cooperação e assistência técnica: Curtiss-Wright Corporation. Reconhecimento à produção: International Alliance of Theatrical Stage Employees (IATSE). Serviços de mixagem de som: RCA Sound System. Tempo de exibição: 102 minutos.


(José Eugenio Guimarães, 1975)

4 comentários:

  1. Eugenio,

    Um dos poucos filmes do Duke que não consta dos meus Alfarrábios. Sim, isto mesmo; não vi esta sua fita, além de não ser muito fanático por fitas deste gênero.

    Vi Iwo Jima, O Portal da Gloria, que muitos enaltecem até como sendo o mais perfeito filme de guerra, e não lhe dei o valor que os outros dão.. Até prefiro Terrível Como O Inferno/55, do Hibbs, fita baseada nas proezas do grande Heroi da 2a. Grande Guerra, o Audye Murphy. Ele é mais classico, tem mais veracidade nas cenas mostradas, é muito bem fotografado e até classifico como a segunda melhor atuação do Murphy em sua carreira (a primeira e melhor foi O Passado Não Perdoa), além de seu próprio heroi refazer as cenas pelas quais foi o protagonista na realidade. Um bom filme.

    No demais A Ponte do Rio Kway/57, não por tanto que acham dele, mas por ser uma fita classe A do Lean e feita com todo o esmero próprio do Grande Artesão.
    Mais O Resgate do Soldado Ryan, do Spielberg e mais uns poucos deste gênero assisti e escapam. Até mesmo aquele do Walsh, com o Errol Flinn, Um Punhado de Bravos/45, foi muito mais filme que Iwo Jima.

    Com todas as desculpas e respeito aos demais companheiros que amam o gênero e a ti que lutou para criar mais esta bela postagem.

    jurandir_lima@bol.com.br

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Jurandir, tanto OS TIGRES VOADORES como IWO JIMA são exemplos de cinema envelhecido. OS TIGRES envelheceu em tudo. Mas IWO JIMA - se está datado com respeito à questão técnica e aos efeitos especiais - continua sendo um clássico de respeito, principalmente no tocante ao retrato que faz da dimensão humana dos soldados - caro raro, em se tratando de um filme francamente belicista. É peça de propaganda, do mesmo jeito que OS TRIGRES. Poucas lembranças tenho do filme protagonizado pelo Audie Murphy, se bem que o tenho resenhado em meus arquivos. Os filmes de guerra que me atraem são aqueles que fazem a crítica da estupidez da guerra, os chamados antibelicistas. Meus filmes de guerra preferidos são:

      1) "Vá e veja" (1985), de Elen Klimov.

      2) "Um passeio ao sol" (1945), de Lewis Milestone.

      3) "Também somos seres humanos" (1945), de William Wellman.

      4) "Mortos que caminham" (1962), de Samuel Fuller.

      5) "Nada de novo no front" (1930), de Lewis Milestone.

      6) "Fomos os sacrificados" (1945), de John Ford.

      7) "Agonia e glória" (1980), de Samuel Fuller.

      8) "Glória feita de sangue" (1957), de Stanley Kubrick.

      9) "Os que sabem morrer" (1957), de Anthony Mann.

      10) "Gloriosa retirada" (1964), de Henri Verneuil.

      11) "Johnny vai à guerra" (1971), de Dalton Trumbo.

      12) "Corações e mentes" (1974), de Peter Davis.

      13) "Apocalipse now" (1979), de Francis Ford Coppola.

      14) "Cartas de Iwo Jima (2006), de Clint Eastwood.

      15) "Nanjing! Nanjing!" (2009), de Chuan Lu.

      16) "Morte sem glória" (1956), de Robert Aldrich.

      17) "O grande desfile" (1925), de King Vidor.

      18) "O preço da glória" (1949), de William Wellman.

      Há mais, mas a lembrança, neste momento, não ajuda.

      Abraços.

      Excluir
  2. Eugenio,

    Não se trata especialmente do cunho que eles transmitem, do ponto veridico que eles abordam ou mesmo da propaganda negativa que a guerra traz. Não é nada disso pois, existem sim filmes bem feitos, filmes bem acabados, filmes com dimensões profundas e tudo o mais.

    O que quero citar é o gênero. Da mesma forma que não dispenso um WESTERN, dispenso sempre de assistir a um filme bélico. Claro que sem tirar os valores estéticos e/ou criticos de muitos deles.

    Desta sua lista vi muitos. E fica dificil negar a qualidade de diversos ali transcritos.

    Abração

    jurandir_lima@bol.com.br

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Daquela lista, Jurandir, estou louco para rever TAMBÉM SOMOS SERES HUMANOS. Só o vi na infância das calças curtas. Nunca mais apareceu no meu caminho.

      Recomendo-lhe o VÁ E VEJA, contundente exemplar do cinema russo.

      Abraços.

      Excluir