domingo, 10 de novembro de 2013

A MAIS VIOLENTA AVENTURA CINEMATOGRÁFICA DE TARZAN

Viçosa/MG, meados dos anos 60: a dieta de um menino atraído pela cinefilia era composta por filmes dos estúdios Disney, variados westerns, comédias românticas, aventuras bélicas e de capa-e-espada, épicos bíblicos e pseudo-históricos, reapresentações das estripulias de Harold Lloyd, do Gordo e o Magro e de Os Três Patetas. E, claro, não podiam faltar as peripécias de Tarzan. Nessa época, o personagem criado por Edgar Rice Burroughs vivia prolongada decadência cinematográfica, quadro acentuado desde 1948, quando Johnny Weissmuller deixou de representá-lo após vestir a tanga ao longo de 12 aventuras. Mesmo assim, o homem-macaco teria fôlego para atravessar a década de 60 e continuar nas telas mais além. Eu estava com nove anos quando vi, em 1965, Tarzan, o magnífico (Tarzan the magnificent, 1960), de Robert Day. Fiquei impressionado, em primeiro lugar, pela violência excessiva, algo inédito se comparado a outros filmes do personagem. Também não havia as famosas e divertidas acrobacias em rios, árvores e cipós, ou medições de força com animais. Mais tarde, por conta de revisões, percebi o quanto este Tarzan estava distante de qualquer veleidade que lembrasse o "bom selvagem". É excessivamente metódico, calculista, pragmático e tingido de civilização. A apreciação, datada de 1976, foi iniciada por volta de 1969, quando minhas anotações ainda eram feitas em pequenos cadernos escolares, organizadas em tópicos que resumiam o filme e lhe apontavam algumas qualidades. A adjetivação excessiva, típica da idade, foi suprimida, restando o pequeno texto a seguir.






Tarzan, o magnífico
Tarzan the magnificent

Direção:
Robert Day
Produção:
Sy Weintraub, Harvey Hayutin (não creditado)
Paramount
EUA — 1960
Elenco:
Gordon Scott, Jock Mahoney, Alexandra Stewart, John Carradine, Betta Saint John, Lionel Jeffries, Gary Cockrell, Earl Cameron, Charles "Bud" Tingwell, Al Mulock, Harry Baird, Christopher Carlos, Ron McDonnell, John Sullivan, Ewen Solon, Jacqueline Evans, Thomas Duggan, Peter Howell, John Harrison, George Taylor.



O diretor Robert Day


Esta é a trigésima-sexta aventura cinematográfica do personagem criado por Edgar Rice Burroughs. Nas telas, em termos de sobrevida, ninguém se compara a Tarzan. Apareceu pela primeira vez em 1918, na pele de Elmo Lincoln, em Tarzan, o homem macaco (Tarzan of the apes), de Scott Sidney.



Gordon Scott, professor de educação física, é o décimo-primeiro intérprete de Tarzan


O massudo professor de educação física Gordon Scott é o décimo-primeiro intérprete de Tarzan. Vestiu a tanga pela primeira vez em Tarzan na selva misteriosa[1] (Tarzan’s hidden jungle, 1954), de Harold Schuster. Depois apareceu em Tarzan e o safari perdido[2] (Tarzan and the lost safari, 1956) e Tarzan e tribo Nagasu[3] (Tarzan fight for life, 1958), dirigidos por Bruce Humberstone. Sob as ordens de John Guillermin atuou em A maior aventura de Tarzan (Tarzan’s greatest adventure, 1959).


Após Tarzan, o magnífico, Scott passou a tanga a Jock Mahoney, intérprete do personagem em Tarzan vai à Índia (Tarzan goes to India, 1962) e Os três desafios de Tarzan (Tarzan’s three challenges, 1963), realizados por Robert Day.


Gordon Scott é Tarzan em Tarzan, o magnífico: a mais violenta caracterização do homem-macaco


Mahoney é o vilão Coy Banton em Tarzan, o magnífico. Condenado por assassinato, escapa da prisão graças à pronta e brutal ação de seus irmãos — Martin (Mulock), John (Cockrell) e Ethan (McDonnell) — e do próprio pai — Abel Banton (Carradine). Os Banton formam uma quadrilha de métodos cruéis e covardes. Na libertação de Coy, matam um guarda. A seguir, buscam refúgio na selva. Mas são perseguidos pelo Inspetor Wintors (Sullivan). Este recaptura Coy. Mas é emboscado e assassinado pelos Banton quando reconduzia o fugitivo ao presídio de Kayroby.


O vilão e assassino Coy Banton (Jock Mahoney) com  Fay Ames (Betta Saint John)

Abel Banton (John Carradine) com os filhos Martin (Al Mulock, à esquerda) e John (Gary Cockrell)


Tarzan intervém. Consegue deter e imobilizar Coy. Por segurança, pretende transportá-lo de barco à prisão. Mas Abel Banton, prevendo os movimentos do homem-macaco, intercepta e destrói a embarcação antes que chegue ao porto.


Agora, a única opção para chegar a Kayroby é um longo percurso a pé, por terreno perigoso e mal explorado. A situação ruim é agravada quando Tarzan se vê obrigado a contar com a companhia de passageiros do barco destruído: o cientista Ames (Jeffries) e sua esposa Fay (Saint John); o médico Conway (Tingwell) e a namorada Lori (Stewart); e o auxiliar de piloto Tate (Cameron). Atrás do grupo, ganhando terreno, seguem Abel, Martin e John. Ethan morreu na emboscada que vitimou Wintors.


De esquerda para a direita: Conway (Charles Tingwell), Tarzan (Gordon Scott), Lori (Alexandra Stewart) e Ames (Lionel Jeffries)


O casal Ames traz vários problemas à comitiva de Tarzan. O marido, cientista arrogante, é tão incapaz e covarde quanto o Dr. Zachary Smith (Jonathan Harris) da série de televisão Perdidos no espaço (Lost in space)[4]. A esposa posa de lady enfastiada. Coy, perspicaz, canaliza a situação em proveito próprio. Provoca Mr. Ames de todas as formas. Leva-o a disparar tiros inúteis, que servem à orientação dos bandidos. Flerta com Fay, que o liberta, acompanhando-o na fuga. Mas a pobre coitada é abandonada e devorada por leões. Coy reencontra a família, mas não há tempo para comemorações. Tarzan logo aparece. No embate com o homem-macaco morrem todos, exceto Coy. Outra vez recapturado, é, enfim, entregue às autoridades da fronteira.


John Carradine interpreta Abel Banton

Gordon Scott é um Tarzan exímio no manejo do arco e flecha


Tarzan, o magnífico surpreende. É, provavelmente, a mais violenta aventura cinematográfica do personagem. Aqui, o homem-macaco não está para brincadeiras. Guarda pouquíssimas semelhanças ao “bom selvagem” tantas vezes visto nas telas e que teve melhor personificação pelo campeão olímpico de natação Johnny Weissmuler[5]. O Tarzan do filme em apreço é um vingador furioso e implacável, sempre armado de arco e flecha. Não se faz acompanhar de Cheeta, Jane e Boy. Dispensa cipós e sequer emite o famoso grito. Nunca esteve tão racional, adulto e ocidentalizado.


Foi filmado no Quênia com a participação das tribos Kikuyo e Masai.






Roteiro: Berne Giler e Robert Day, com base no personagem de Edgar Rice Burroughs. Direção de fotografia (Eastmancolor): Ted Scaife. Direção de arte: Ray Simm. Montagem: Bert Rule. Gerente de produção: Roy Parkinson. Assistente de direção: Clive Reed. Operador de câmera: Alan Hume. Fotografia adicional: Jack Mills. Supervisão de som: John Cox. Gravação de som: Bob Jones, Buster Ambler. Edição de som: Ted Mason. Continuidade: Betty Harley. Decoração: Scott Slimon. Guarda-roupa: Felix Evans. Penteados: Ivy Emmerson. Música: Ken Jones. Maquiagem: Tony Sforzini. Produção executiva: Sy Weintraub (não creditado), Harvey Hayutin (não creditado). Tempo de exibição: 82 minutos.


(José Eugenio Guimarães, 1976)



[1] No Brasil, também é conhecido como Tarzan e os selvagens.
[2] No Brasil, também é conhecido como Tarzan e a expedição perdida.
[3] No Brasil, também é conhecido como Tarzan luta pela vida.
[4] Criação de Irwin Allen e produção da Columbia Broadcasting System (CBS). São três temporadas com total de 84 episódios realizados de 1965 a 1968 e originalmente levados ao ar durante o mesmo período.
[5] Johnny Weissmuler interpretou Tarzan em doze filmes realizados de 1932 a 1948: Tarzan, o homem macaco, (Tarzan the ape man, 1932), de W. S. Van Dyke; A companheira de Tarzan (Tarzan and his mate, 1934), de Cedric Gibbons e dos não creditados Jack Conway e James C. McKay; A fuga de Tarzan (Tarzan escapes, 1936), de Richard Thorpe e dos não creditados John Farrow, James C. McKay, George B. Seitz e William A. Wellman; O filho de Tarzan (Tarzan finds a son!, 1939), de Richard Thorpe; O tesouro de Tarzan (Tarzan's secret treasure, 1941), de Richard Thorpe; Tarzan contra o mundo (Tarzan's New York adventure, 1942), de Richard Thorpe; Tarzan, o vingador (Tarzan triumphs, 1943), de Wilhelm Thiele; Tarzan e o terror do deserto (Tarzan's desert mystery, 1943), de Wilhelm Thiele; Tarzan e as amazonas (Tarzan and the amazons, 1945), de Kurt Neumann; Tarzan e a mulher leopardo (Tarzan and the leopard woamn, 1946), de Kurt Neumann; Tarzan e a caçadora (Tarzan and the huntress, 1947), de Kurt Neumann; e Tarzan e as sereias (Tarzan and the mermaids, 1948), de Robert Florey. No Brasil, Tarzan, o homem macaco é também conhecido como Tarzan, o filho das selvas

13 comentários:

  1. Esse Tarzan sempre me marcou e fez parte de meu imaginário das tardes dos anos 70. O Eugênio marca sua critica comentando a violência, ou quase truculência, do personagem Tarzan, que atravessa essa narrativa nas selvas. Mas confesso que, entre meio assustado e desejando cenas tão fortes quanto as do filme, gostava desse Tarzan que está para pouca conversa e quer resolver o que precisa ser resolvido. Ainda que o bom selvagem fique para trás, um Tarzan mais contemporâneo nunca me incomodou...Vai ver que um certo senso de justiça rápida e precisa me acompanhe desde tenra adolescência. Uma vez um herói, sempre um herói.

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    1. Hoje, provavelmente, talvez não ficasse tão impressionado com este Tarzan, meu caro "Anônimo" (você não assinou o comentário!). Mas, na idade dos 9 anos, este Tarzan mexeu com o meu imaginário curtido de tanto ver outras realizações mais anemas do homem-macaco. Quanto ao mais, só posso concordar com você. Este Tarzan estava à frente do seu tempo. É um Tarzan para os dias de hoje.

      Abraços.

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  2. Amigo, como é bom relembrar.....
    Tarzan e Perdidos no espaço!!!Sempre adorei estas séries, muito interessantes e exaltavam a bondade, o contato com o animal selvagem, mas não havia maldade...e perdidos no espaço era muito show, eu não perdia de forma nenhuma!!!!
    bjus
    obrigada pela grande lembrança!
    http://www.elianedelacerda.com

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    1. Olá, Elyane Lacerda.

      Também fui um ardoroso fã de Perdidos no Espaço, sem esquecer outras aventuras seriadas como Terra de Gigantes, Túnel do Tempo, que transitavam pelo terreno da ficção científica. Mas as que mais curtia eram os westerns como O Homem de Virginia, Bonanza, Chaparral, Lancer...

      Este "Tarzan, o magnífico" é um filme único dentre todos aqueles que foram dedicados ao Homem Macaco. Provavelmente, é o mais adulto, exatamente devido às características que explicitei.

      Abraços.

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  3. Quando Sol Lesser saiu da produção dos filmes de Tarzan, assumiu Sy Weintraub, que passou a produzir as aventuras do Homem-Macaco de uma forma mais adulta, quase que perdendo a áurea fantástica do herói criado por Edgar Rice Burroughs. Quando ele enfrenta o vilão interpretado por Anthony Quayle e o derrota, nem o grito de vitória dos grandes macacos é ecoado pelo herói. Outro detalhe nas produções de Weintraub é que Tarzan passa a ser mais articulado e inteligente no que nos filmes produzidos por Sol Lesser e que tinham Johnny Weissmuller e Lex Barker como intérpretes do Rei das Selvas. Gosto muito de Gordon Scott, que também pegou as produções de Lesser, e se o compararmos nas atuações anteriores, se nota a mudança de interpretação de Scott a partir destes dois exemplares produzidos por Weintraub! Muito bom!!!!!

    Abraços

    PAULO TELLES
    BLOG FILMES ANTIGOS CLUB ARTIGOS
    http://www.articlesfilmesantigosclub.blogspot.com.br/

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    1. Paulo Telles,

      Este comentário de "Tarzan, o magnífico" é um dos primeiros que ousei escrever para um filme. Começou a tomar forma em fim dos anos 60, conforme destacado na postagem. Ainda sou impressionado com a racionalidade e o pragmatismo que dominam o personagem nesta aventura. São características que me provocaram estranhamento quando a assisti em 1965. Nessa época, estava tomando conhecimento de várias outras aventuras do Homem Macaco, sempre reprisadas nos cinemas. Os títulos eram incontáveis. Todo domingo havia um filme de Tarzan em exibição nos cinemas de Viçosa. Mas "Tarzan, o magnífico" ainda mantém a aura de obra única.

      Forte abraço.

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    2. O melhor filme de Tarzan de todos os tempos com o melhor ator para o papel, a melhor história e o melhor final. Sou fã incondicional desse filme top 20, pois mostra muito de nossa civilização ocidental e que precisa sempre do espírito usado pelo herói nesta película para conseguir vencer os desafios da vida.

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    3. Olá, Edison Peixoto!

      Ao menos para mim, TARZAN, O MAGNÍFICO é o mais realista dos filmes do personagem. Faz muito tempo que o vi. Na ocasião, os cinemas ainda exibiam muitos realizações com Tarzan. Na cidade onde cresci, Viçosa/MG, geralmente se via um exemplar todo fim de semana. Mas a peculiaridade de TARZAN, O MAGNÍFICO, me marcou para sempre. É um filme único sobre o Homem-Macaco".

      Abraços.

      José Eugenio Guimarães

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  4. Gordon Scott é super lindo, tb me marcou seu Tarzan... Adoraria rever...

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    1. Acredito que não será difícil encontrar TARZAN, O MAGNÍFICO em sites e/ou programas de download, Sibely! Já tentou uma busca no youtube? Sei, ao menos, que aí poderá encontrar muitas imagens em movimento com o Gordon Scott.

      Abraços e boa tarde.

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  5. Eugênio, muito boas as matérias e os comentários (de alto nível) deste seu blog. Tudo muito bom mesmo. Sobre esta matéria a respeito de Gordon Scott e seu "Tarzan, o Magnífico", é perfeita. Realmente é um Tarzan diferente, violento, perigoso. Também observei isto desde a primeira vez que o vi. Na época não gostei muito de ver Jock Mahoney (então um de meus heróis do faroeste), aparecendo como um bandidão sem escrúpulos. Mas eu tenho este como um dos bons filmes de Tarzan. Tem muita gente que considera Gordon Scott como tendo sido o melhor dos três mais famosos Tarzans (Johnny Weissmuller, Lex Barker e Gordon Scott). Não é o meu caso. Continuo com Weissmuller.
    Grande abraço e parabéns por este blog e seu consistente conteúdo.

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